24 de set. de 2004

Dicas pra sobreviver fora do Brasil!


Esse post, eu escrevi ha' varios alguns meses la' no blog e as reacoes foram super interessantes. Muita gente me escreveu dizendo que tem tido uma postura muito negativa e que esse post ajudou a ver as coisas de outra forma. Por isso, resolvi reproduzir (e adaptar um pouquinho) aqui:

(...)

Viver fora do seu pais nao e tao facil. Mas eu acho que é muito importante ter não somente uma visão positiva, mas mesmo uma postura positiva, pra ser feliz.

Fiquei pensando no que eu diria pra alguém que mudou pra outro país, ou está pretendendo mudar, para que possa ser mais feliz. Acabou ficando uma lista muito grande, mas você pode ir lendo aos poucos, uma coisinha por dia... ah, e acrescente outras nos repliess, OK? lembrando sempre que essa é a minha perspectiva e não quer dizer que todo mundo deve seguir ou concordar comigo!

1. Não esqueça nunca de onde você veio, sua pátria fez de você o que você é, mas deixe isso guardadinho em algum lugar no seu coração, não fique falando ou pensando nisso o tempo todo e comparando os dois países. Agora você está começando vida nova e deve isso a você e à(s) pessoa(s) que está(ão) lhe acompanhando nessa jornada.

2. Em ambos países você vai encontrar coisas boas e ruins, a diferença é que estamos sempre mais acostumadas com as coisas ruins de onde viemos. Existe coisa pior que ver crianças nas ruas passando fome, pedindo dinheiro, cheirando cola? quem diria que alguém pode se acostumar com isso? mas nos acostumamos, não é?

3. Tente esquecer os estereótipos. Esses são apenas caricaturas, e estamos convivendo com pessoas reais. Nem sempre brasileiros são tão amigáveis e nem sempre os "gringos" são tão "frios". Gosto de lembrar uma festa que eu fui na Suécia há vários anos atrás. Aniversário de 70 anos (imagine), achei que ia ser um tédio mortal, mas nunca fui tão bem tratada e me diverti muito. Literalmente TODAS as pessoas da festa vieram falar comigo, se apresentaram, perguntaram sobre mim, foram extremamente gentis, pessoas de todas as idades. Cerca de um mês depois fui a uma festa, em São Paulo, na casa do meu irmão. Uma turma descolada, do "mangue beat" pernambucano em Sampa. Praticamente ninguém falou comigo. Não conhecia ninguém e ninguém fez questäo de se apresentar. Portanto, tudo é relativo.

4. Outro estereótipo que eu detesto é que só brasileiro sabe se divertir, que a vida aqui é monótona, que os shows não tem emoção. Já comentei aqui no blog um show que fui do Blur, banda pop britânica, que eu adoro. O show foi o melhor da minha vida. Todo mundo se divertiu muito, dançou horrores, gritou, se emocionou. Com uma diferença, não tinha bebida. Acabou o show, todos sairam ordeiros pras suas festas pós-show ou pra casa. Ninguém quebrou os pontos de ônibus ou fez bagunça nas ruas. Adoro isso! Talvez você não esteja tendo oportunidade, ainda, pra se divertir mas isso não significa que os "locais" estão tendo uma vidinha tão insípida assim!

5. Quando se quer falar que as pessoas da Europa são frias, se diz que eles entram no metrô e enfiam o livro na cara, não olham, nem falam com ninguém. Bem, pelo menos em Recife, não vejo ninguém puxando conversa em ônibus e quando fazem isso as pessoas já ficam com medo, pensando que é um assalto. Não vamos ter expectativas exageradas do povo daqui, né?

6. Que tal porcurar o lado positivo das pessoas do local? aqui eles são honestos, ordeiros, organizados... isso tudo pode ser bom... são "sovinas", "neutros ao extremo", "arrogantes"... então vamos tentar achar isso engraçado?? enfim, aprender a conviver com o que a gente tem, pode ser a regra de ouro da felicidade!

7. Não adianta reclamar do clima. Tá frio? tem que se agasalhar. Aqui, na Suécia, se diz que "não existe frio, mas gente mal agasalhada", Ok, é um certo exagero, aqui tem frio e muito. Mas, não há nada que se possa fazer em relação a isso, é o que digo sempre à Bia. Entäo, vamos tentar ver o lado positivo... você não vai ficar toda suada, pode usar uma linda maquiagem que não derrete e dura a noite toda, as roupas são lindas, a gente fica mais elegante. E o que eu adoro... diminui a ditadura do corpo perfeiro, ninguém tá vendo tudo mesmo, fica todo mundo mais ou menos na mesma "posição". Ah e eu adoro abusar de luvas e cachecóis lindinhos (e baratos!).

8. Quando sair de casa, olhe a cidade com olhos de turista, pense "gente, quantas pessoas não adorariam estar vendo essa cena, hoje, e eu estou aqui?" estou sempre descobrindo novas facetas da cidade, novas caras. Pego o metrô e me delicio vendo Gamla Stan, TODAS as vezes que passo por ela... estar num lugar lindo é um privilégio que, às vezes, a gente esquece. Eu já fazia isso em Olinda,
quando ia entrando na cidade eu pensava "e os gringos pagam uma nota pra ver minha cidade, que é tão linda e eu tenho de graça, todo dia!".

9. Valorizar essas pequenas coisas do lugar em que você vive é fundamental. Você não gosta da comida? sempre tem UMA coisinha pelo menos que você vai gostar. Ai, se delicie com ela, ao invés de ficar procurando feijão e goiabada nas lojas especiais. Não tenho quase nenhuma saudade da comida do Brasil. Esqueço que ela existe, por que não é mais uma opção pra mim e não dá pra se viver de ar, nem de nostalgia. Adoro kokosbola, adoro as verdurinhas congeladas, adoro cuscuz marroquino, amo iogurte de blueberry... queijo de coalho?? o que é isso?

10. Não deixe a saudade acabar com você. Mais uma vez, lembre-se que foi sua OPÇÃO... essa é a palavra chave. As pessoas que ficaram no Brasil e lhe amam querem ver você bem. Seja feliz e deixa a saudade, também, guardadinha lá no fundo do coração.

11. Evite viver em guetos. É muito legal encontrar brasileiros, trocar idéias (mas evite ficar só falando mal do país e das suas saudades do Brasil!), ouvir nossa música juntos, mas não se restrinja a isso. Tente estabelecer contatos com pessoas nativas do país e outros migrantes. Absorva novas culturas, isso é refrescante, revitalizante. Saber que existem culturas diferentes da sua e respeitá-las é o primeiro passo para a tolerância.

12. Aprenda o idioma local. Mas "take your time", faça-o quando você se decidir (também não vale esperar mais de um ano pra começar!), se puder se virar em outro idioma. É fundamental aprender o idioma, mas é melhor se você estiver com a mente aberta, e às vezes é necessário um tempo para adaptação.

13. Pense que, pelo menos no começo, você é um(a) turista com mais tempo pra conhecer a cidade... vá visitando tosos os museus, mas agora com muito mais tempo, um por dia, vá conhecendo todos os pontos turísticos, a cidade tem muito a oferecer e você tem tempo... e lembre que, muitas vezes isso pode custar pouco ou quase nada.

14. Não se deixe contaminar pelo mal humor de outras pessoas. Evite as longas conversas do tipo "eu odeio esse país por que...". Desmonte seu parceiro de papo mostrando tudo de bom que você encontrou aqui.

15. Lembre que você não está sozinha e seu mau humor vai contaminar os outros. A maioria de nós, pelo que percebi nos blogs, veio parar aqui por AMOR. Viemos por que quisemos, eles (ou elas) podiam ter mudado pro Brasil, mas, nesse momento, decidimos que a melhor opção é viver fora do Brasil. Então, respeite a pessoa que você ama, respeite sua cultura, suas tradições, seu país. Evite conflitos do tipo "se eu estivesse no Brasil seria diferente". Pode ser um atalho pro amor ir embora. Ah, e exija respeito com o Brasil também!

16. Use e abuse da Internet. Não apenas para matar as saudades do Brasil, saber notícias de lá, se comunicar com sua família... mas também para ir descobrindo sua nova pátria, visitando os sites de turismo da sua nova cidade, descobrindo o que tem para oferecer. Visite o site do Governo local, veja quais os direitos e deveres que você tem, como imigrante, conheça mais da cultura local.

17. Faça seu blog. Eles são uma delícia, você encontra grandes amigos e compartilha com outras pessoas as suas experiências.

18. Nossa música é a melhor do mundo, certo? sem dúvida, mas não custa experimentar novos tons. A palavra mágica para um imigrante é EXPERIMENTAR. De tudo, música, dança, comida, bebidas, tudo que estiver ao seu alcance.

19. Imigrante não é um palavrão. Entre 1800 e 1930, não menos que 1.5 milhão de suecos tornaram-se imigrantes na America do Norte. É tudo uma questão conjuntural. Quantos portugueses, italianos, espanhóis, ingleses, não acolhemos no Brasil? Ainda mais num mundo globalizado como esse, somos todos, cidadãos do mundo!

20. O mais importante de tudo... NUNCA, mas NUNCA mesmo se sinta inferior aos nativos do país. Você está lá por uma contingência da vida, não está lá pra se aproveitar do país deles. Está se sentindo discriminado, procure um órgão que defende o imigrante, que existe em quase todo luga... denuncie... a discriminação é velada? ignore, despreze... quando eu acho que alguém (geralmente os mais velhos) pode estar olhando pra mim com alguma discriminação sempre penso "coitado, nem imagina tudo de bom que eu tenho no meu país"... e lembre sempre que você tem um enorme valor e pode trazer grandes contribuições para o seu novo país. Lembre sempre que a França nunca teria sido campeão do mundo, se não fosse Zidane, que tem origem na Argélia.

E viva as diferenças!!!!


Blog: Síndrome de Estocolmo